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Sonho em pontas
Texto de Andreia Carneiro

Um foco de luz incidia sobre o seu corpo de mulher. O branco do seu traje devolvia-lhe a pureza de menina. Penteado tradicional, corpo preparado para a elevação.
O rosto mostra que nasceu para ali estar, segura, em si mesma, como se nunca tivesse feito outra coisa. Olhos rasgados, pintados, com perfeição, elevam-se e as sobrancelhas conseguem sorrir nesta pose inicial mostrando a felicidade sentida.
As sapatilhas eram as de alguns anos, mas o chão que pisava até então era bem menos definitivo, mas tão precioso… A música começa a soar, as pernas erguem-se e o olhar perde-se por entre os senhores sentados. Mas, os seus olhos sabiam, exatamente, onde estavam… Na linha do seu próprio horizonte… Eram lá que desejavam estar!
Entre os passes básicos e os complexos voava como um pássaro livre, mal posava no chão de madeira a não ser naquelas alturas que a colocação em pontas o fizesse prever. Vontade, garra e empenho nos 18 anos tão vividos no meio do encantamento e da filosofia de uma bailarina, que outra coisa não podia ser.
Pequena de grande talento inundou a sala de energia e colou o júri a si própria, isto é uma árdua tarefa quando falamos na companhia Bolshoi, fundada a 17 de Março de 1977.
Moscovo tem o frio de gelar, mas é a cidade encantada para as fantasias do bailado e dos sonhos em pontas e por isso são das mais duras realidades, porque só realmente os melhores do Mundo tem o prazer de pisar o Auditório do teatro Bolshoi.
Franceska era mais uma nas audições, de vários dias, com tempo estabelecido para uma apresentação preparada ao pormenor, num dia que pode ser fatídico para qualquer sonhador.
Para trás ficara anos de dedicação, os pais numa pequena cidade Kirov a 900 km’s da Capital.
Os pais de Franceska sonhavam com a ida para uma Universidade, abraçando a carreira de enfermeira que falava desde criança, mas poderia ser que o dia de hoje a fizesse mudar de ideias e quem sabe dar um gosto especial aos pais com a continuação dos estudos.
Após a apresentação de 2 minutos e 40 segundos, a resposta que a nossa heroína ambicionava não surgiu, apenas lhe foi dada a indicação de que esperasse no hall de entrada para saber o próximo passo. Nem trocou de roupa, sentou-se no chão daquela espécie de sala de espera improvisada. A luta e o desempenho poderia dar bons frutos, nunca se sabe, mas a máxima é sempre a mesma em cada situação: 0% de expectativa e 100 % de empenhamento.
E se a resposta for NÃO… Olhava para o chão tão limpo que refletia a sua imagem… Assim parecia perguntar a si própria… E se for NÃO… Pois, Franceska sabia que não iria ser, apenas, o sonho de uma carreira que iria passar por um ponto de interrogação, e claro, a sua vida também…
Marcello Vincenzo Domenico Mastrojanni, ator dizia com todo fervor, “Faço o que gosto, pagam-me por isso e ainda me batem palmas… que mais posso querer?”.
E foi esta a frase que a Franceska encarnou a partir deste dia, na Companhia que iria exigir dela tudo o que tem e o que não tem. Agora é e está, entre as melhores do Mundo.

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